Reparei que havia uma fila nova no sentido oposto da sala de espera. Murmurando, como se rezando estivessem na penumbra de Igreja cheirando a velho e com todos os antigos santos nos nichos laterais prontos a receber os olhares enternecidos de paroquianos praticantes.
A conversa ao telemóvel altera a regularidade do murmúrio explicando – «que uma taxa é de análises, a outra é dum TAC, tem mais outra de consulta e também de ecografia. À pois, é muito dinheiro, cem euros não chegam. Que vá a Segurança Social resolver a isenção.» Vai mais um, vai outro, outra, agora uma velhota de cadeira de rodas e a rapariga empurra… pede licença e lá vai levar a pica.
A leitura do “Melo Antunes – Sonhador pragmático” que comprei nos saldos da FNAC não tem conseguido abstrair-me de todos os que ali estão. Fechei-o e voltei a olhar para a fila invertida. Afinal já consegui perceber que é o guichê onde se pagam as “moderadoras”. Que sugestivo nome lhes deram. Muito do som falante é de lá que vem e, na maior parte das vezes, dizendo mal da sorte calhada – primeiro paga, depois espera a chamada.
Já não há pragmatismo que encaixe na generosidade do “sonhador”…
Silvestre Félix